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ARTIGO ORIGINAL

Avaliação de um programa regular de atividade física sobre os custos médico-hospitalares de uma empresa de serviços de saúde

Assessment of a physical activity program on the medical-hospital costs of a healthcare company

Paula Keiko Mitsunaga; Marcia Bandini; Sérgio Roberto de Lucca; Djalma de Carvalho Moreira-Filho

DOI: 10.5327/Z1679443520180245

RESUMO

INTRODUÇÃO: O efeito protetor da prática regular de atividade física na redução do risco de doenças crônicas não transmissíveis e dos custos médico-hospitalares é bem estabelecido na literatura. No entanto, o Brasil carece de estudos que avaliem os impactos financeiros de programas que incentivem a prática de atividade física no trabalho.
OBJETIVOS: Avaliar o impacto financeiro de um programa de incentivo à prática regular de atividade física sobre os custos médico-hospitalares de uma empresa privada de serviços de saúde.
MÉTODOS: Os custos médios per capita com o plano de saúde da empresa foram acompanhados por um ano e comparados no que diz respeito aos trabalhadores que praticaram atividade física com frequência suficiente e os que não aderiram ao programa. Os pares de comparação foram homogeneizados de acordo com a idade, o sexo e o tempo de empresa.
RESULTADOS: Dos 3.744 trabalhadores com acesso ao programa, apenas 80 praticaram atividade física 2 vezes por semana ou mais. O custo médio per capita foi R$ 2.874 (DP=5.259) em 1 ano, R$ 125,00 a mais do que para os que não praticaram (p=0,88). Aqueles que praticaram atividade física 3 vezes ou mais por semana (n=32) apresentaram custo médio per capita de R$ 3.635 (DP=6.994) em 1 ano, R$ 1.901 a menos do que os pares que não praticaram (p=0,34).
CONCLUSÕES: O estudo não permite afirmar que houve redução dos custos médico-hospitalares dos participantes do programa. Maior tempo de seguimento e ajustes no desenho do projeto são necessários para avaliar seu impacto.

Palavras-chave: promoção da saúde; custos de cuidados de saúde; ambiente de trabalho; doenças crônicas não transmissíveis.

ABSTRACT

BACKGROUND: The protective effect of regular physical activity against risk of development of noncommunicable diseases and reduction of medical-hospital costs are well established in the literature. However, no study investigated the financial impact of workplace physical activity promotion programs in Brazil.
OBJECTIVE: To investigate the financial impact of a workplace physical activity promotion program on the medical-hospital costs of a private healthcare company.
METHODS: The average healthcare cost per capita was monitored along one year and compared between employees who performed physical activity with sufficient frequency and the ones who did not adhere to the program. Employees were matched per age, sex and length of work at the company.
RESULTS: From 3,744 employees offered participation in the program, only 80 performed physical activity 2 or more times per week. The average medical-hospital cost per capita/year was BRL 2,874.00 (SD=5.259), being BRL 125.00 higher, on average, for the employees who did not adhere to the program. The average medical-hospital cost per capita/year was BRL 1,901.00 lower, on average, for the employees who performed physical activity 3 or more times per week (n=3) compared to the ones who did not (p=0.34).
CONCLUSIONS: The results of the present study do not allow asserting that the medical-hospital costs of employees who adhered to the program decreased. Longer follow-up and adjustments in the program design are needed to assess its actual impact.

Keywords: health promotion; health care costs; working environment; noncommunicable diseases.

INTRODUÇÃO

As doenças crônicas não transmissíveis (DCNT) representam um dos maiores problemas de saúde pública da atualidade. Estimativas da Organização Mundial da Saúde (OMS) indicam que, apenas em 2015, as DCNT foram responsáveis por cerca de 40 milhões de mortes, quase 70% da mortalidade global. As principais causas de morte por DCNT foram doenças cardiovasculares (45%), câncer (22%), doenças respiratórias crônicas (10%) e diabetes (4%)1.

No Brasil, as estatísticas seguem a mesma tendência. Em 2013, as DCNT foram responsáveis por, aproximadamente, 72% do total de mortes no país. Segundo estimativas da Pesquisa Nacional de Saúde (PNS), 45,1% dos indivíduos entrevistados referiram ter pelo menos uma DCNT, sendo maior a prevalência no sexo feminino (50,4%), em relação ao masculino (39,2%)2. Nesse cenário, o Ministério da Saúde publicou o Plano de Ações Estratégicas para o Enfrentamento das DCNT no Brasil, para o período 2011-20203.

A inatividade física está entre os principais fatores de risco para a mortalidade relacionada às DCNT4. Adultos que não realizam pelo menos 150 minutos de atividade física de intensidade moderada por semana apresentam risco maior de mortalidade em comparação com aqueles considerados ativos5. Estima-se que o sedentarismo seja responsável por 3,2 milhões de mortes no mundo4. Em 2003, um estudo mostrou que 15% das internações do Sistema Único de Saúde (SUS) estavam relacionadas com inatividade física, sendo o impacto financeiro estimado em R$ 275,6 milhões6.

Apesar dos riscos para a saúde, o sedentarismo continua a crescer. Segundo a OMS, em 2010, 23% dos adultos com 18 anos ou mais não realizavam atividade física regular no mundo5. No Brasil, 45,1% da população adulta é considerada fisicamente inativa, apesar de ter ocorrido um aumento de 1,17% ao ano na frequência de prática de atividade física no tempo livre, segundo pesquisa do Vigilância de fatores de risco e proteção para doenças crônicas por inquérito telefônico (Vigitel) 20167. Entre os usuários da saúde suplementar, a frequência de inatividade física diminuiu de 19,2% para 14,2% entre 2008 e 2016.8. Entre os trabalhadores brasileiros, a prevalência de sedentarismo parece acompanhar a média nacional. Estudo conduzido com 6.398 trabalhadores mostrou que 42% dos indivíduos pesquisados eram sedentários9.

A atividade física regular é reconhecida como um fator protetor, reduzindo o risco de doença cardíaca isquêmica, acidente vascular encefálico, diabetes e câncer de cólon e de mama5. Por isso, ações e programas que promovam a prática regular são incentivados em todas as oportunidades possíveis. No Brasil, a Política Nacional de Promoção da Saúde defende os incentivos para a prática de atividade física como um tema prioritário10. A OMS recomenda que os ambientes de trabalho ofereçam oportunidades para que os trabalhadores aumentem seu nível de atividade física, seja no próprio local da atividade laboral ou por meio de outras ações de incentivo5.

Além dos reconhecidos benefícios para a saúde e do incentivo de instituições governamentais e não governamentais, nacionais e internacionais, as empresas têm outros motivos para implementar programas de estímulo à prática regular de atividade física. Buscando reduzir os custos da assistência suplementar oferecida a seus trabalhadores, que hoje já correspondem ao segundo maior gasto com benefícios, sendo superados apenas pela folha de pagamento, as empresas investem cada vez mais em programas de promoção da saúde no trabalho11.

Pesquisa realizada em 2012 indicou que 100% das 194 empresas entrevistadas incluíam plano de saúde como benefício aos seus trabalhadores, sendo que 31% adotavam a modalidade pós-pagamento, 63%, o pré-pagamento e 6%, o modelo híbrido12. No pós-pagamento, as próprias empresas gerenciam o risco da carteira, porque custeiam todas as despesas médico-hospitalares, acrescidas de uma taxa de administração. Já no pré-pagamento, o risco é assumido pela seguradora/operadora e a empresa paga, previamente, um valor (prêmio) que é calculado com base em critérios atuariais e destinado a cobrir os custos no período estabelecido em contrato13. A gestão do sinistro, com o adequado uso dos planos de saúde, é um dos grandes desafios dos empregadores-contratantes do sistema de saúde suplementar, seja no modelo pré-pago ou no pós-pago12.

Os custos com os planos de saúde são crescentes e a variação dos custos médico-hospitalares (VCMH) tem sido sistematicamente superior à inflação geral. Em 2016, a VCMH foi de 20,4%, enquanto o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) foi de 6,3%14. Por isso, os programas de promoção da saúde no trabalho, incluindo aqui aqueles de incentivo à prática regular de atividade física, são alvo de particular interesse das empresas, não apenas pelos benefícios para a saúde, mas também pela potencial redução nos custos com despesas médico-hospitalares11, em especial nos modelos de gestão pós-pagos (pelo custo operacional)13.

Este estudo teve por objetivo avaliar o impacto financeiro de um programa de incentivo para a prática regular de atividade física sobre os custos médico-hospitalares de uma empresa privada de serviços de saúde.

 

MÉTODOS

Este estudo avaliou e descreveu os resultados de um programa de incentivo para a prática regular de atividade física implantado em uma empresa privada de saúde como parte de um pacote de benefícios ofertado aos trabalhadores e subsidiado pela empresa, com incentivos progressivos de acordo com o tempo de empresa e a frequência de uso do programa. No início do estudo, a empresa contava com 8.852 trabalhadores distribuídos em todo o território nacional, que, juntamente com seus dependentes, tinham acesso ao plano de saúde privado no modelo pós-pago, com coparticipação dos usuários. Considerando o heterogêneo perfil dos trabalhadores na utilização do plano de saúde da empresa, foram incluídos no estudo apenas aqueles da Regional São Paulo com mais de 6 meses de empresa (n=3.744), excluindo-se os dependentes. O período de seguimento foi de 12 meses (outubro de 2016 a setembro de 2017).

O programa de incentivo para a prática regular de atividade física foi oferecido pela empresa para todos os trabalhadores por meio de divulgação nos veículos internos de comunicação, como por exemplo intranet e murais de avisos. Não foram estabelecidos critérios de elegibilidade e a adesão foi voluntária. Os aderentes podiam escolher entre quatro tipos diferentes de planos do programa, com coparticipação variável de acordo com cada um. A utilização do programa foi medida com o uso de relatórios mensais gerados pelo fornecedor a partir da utilização de senhas de acesso em diferentes academias da rede credenciada.

As variáveis de interesse que foram analisadas durante o período estudado incluíram: adesão ao programa, frequência suficiente e custo médico-hospitalar médio per capita/ano. Foram considerados aderentes aqueles que usaram o programa, no mínimo, uma vez nos 12 meses. Para definir frequência suficiente, foram utilizados critérios da OMS, que recomenda o equivalente a pelo menos 150 minutos semanais de atividades de intensidade moderada ou 75 minutos semanais de intensidade vigorosa5. A cada utilização da senha de acesso foram estimados 50 minutos de permanência nas academias. Assim, foram analisados os dados dos trabalhadores que usaram o programa, no mínimo, 96 vezes por ano (2 ou mais vezes por semana, em média) e dos trabalhadores que usaram o programa, no mínimo, 144 vezes por ano (3 ou mais vezes por semana em média). O custo médico-hospitalar médio per capita foi analisado a partir dos relatórios mensais que a operadora do plano de saúde envia para a empresa e incluía valores relacionados a consultas, exames, internações, procedimentos terapêuticos, pronto-socorro e outras despesas. Para controlar possíveis distorções na análise, foram excluídos os usuários que geravam gastos para a empresa acima do custo médio per capita/ano, acrescido de três desvios padrão, o que correspondeu a R$ 42 mil.

Os dados foram compilados no programa Microsoft Excel 2016 e analisados no Minitab 17.3.1 2013, 2016, da Minitab Inc. USA. Para comparar os valores do custo médio per capita/ano entre os que praticaram atividade física suficiente e os que não aderiram ao programa, foi utilizado emparelhamento. Assim, garantiu-se a homogeneidade entre os grupos de comparação, emparelhados de acordo com a idade, o sexo e o tempo de empresa. O custo médio per capita/ano foi comparado entre o grupo que apresentou frequência de atividade física igual ou maior a 96 vezes por ano (Grupo A), com o de pares que não aderiram ao programa (Grupo B). Um subgrupo foi avaliado, considerando-se a frequência de atividade física igual ou maior a 144 vezes por ano (Grupo C) e comparado com o de pares que não aderiram ao programa (Grupo D). Foi realizado o teste t de Student para comparação das médias de populações independentes e o teste qui-quadrado para avaliar associações entre variáveis categóricas. A análise de variância multivariada (MANOVA) foi utilizada para avaliar a associação das variáveis quantitativas entre os grupos classificados por variáveis qualitativas. Foram realizadas análises de correlação entre frequência de uso do programa e custo médico-hospitalar.

Os nomes dos trabalhadores foram codificados para preservar a confidencialidade dos dados. O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética e Pesquisa da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), sob o número 2.033.877.

 

RESULTADOS

Dos 5.616 trabalhadores alocados na Regional São Paulo, 3.744 preencheram os critérios de inclusão. Após a divulgação nos veículos internos de comunicação da empresa, 630 trabalhadores (16,8%) aderiram ao programa, ou seja, utilizaram-no pelo menos uma vez durante o período estudado. Os que praticaram atividade física com frequência de 96 vezes ou mais (n=80) e de 144 vezes ou mais (n=32) ao ano, corresponderam a 2,1 e 0,8% do total de indivíduos incluídos no estudo (n=3.744), respectivamente. As características dos trabalhadores incluídos no estudo não eram homogêneas. Houve associação entre as variáveis “sexo” e “frequência de atividade física” maior ou igual a 96 vezes no período estudado. A adesão dos homens foi de 3,98% e, das mulheres, 2,14% (p<0,05). Assim, foi feito o emparelhamento para realizar comparações entre as médias de custos médico-hospitalares. As demais análises estão descritas na Tabela 1.

 

 

Após a realização do emparelhamento, grupos homogêneos foram encontrados. Idade, tempo de empresa e custo médico-hospitalar não apresentaram associação nem com a variável “sexo” (p=0,801; p=0,819; p=0,884) e nem com “frequência de atividade física” maior ou igual a 96 vezes em 12 meses (p=1; p=0,715; p=0,884). Os demais resultados estão demonstrados na Tabela 2.

 

 

Os custos médios per capita/ano foram comparados entre os grupos A/B e C/D. Durante o período estudado, os indivíduos do Grupo A apresentaram custo médio per capita/ano que superava o do Grupo B em R$ 125 (p=0,884), ao passo que os indivíduos do Grupo C apresentaram custo médio per capita/ano R$ 1.901 abaixo do valor atingido pelo Grupo D (p=0,34), conforme demonstrado na Tabela 3. As diferenças encontradas não foram estatisticamente significantes.

 

 

As análises de correlação não mostraram tendências entre frequência de uso do programa e o custo médico-hospitalar (p=0,189).

 

DISCUSSÃO

O impacto que as DCNT causam na população mundial, principalmente aquele atribuído aos fatores de risco modificáveis, como a inatividade física, demonstram a importância da implementação de programas de promoção da saúde e qualidade de vida, inclusive nos locais de trabalho. Além de melhorar a saúde dos trabalhadores, a promoção da saúde no local de atividade laboral parece estar relacionada com aumento da produtividade, redução dos custos médico-hospitalares e retenção de talentos15. Nos Estados Unidos, estudos sobre custos médico-hospitalares sugerem redução da utilização desses serviços após a implementação dos programas de promoção da saúde em empresas e alguns demonstraram retorno sobre o investimento quando fatores relacionados à produtividade, como absenteísmo, são incluídos no cálculo16.

No entanto, para que levem a resultados financeiros positivos, os programas de promoção da saúde no trabalho (PPST) dependem de alguns fatores. Em 2012, uma metanálise conduzida por Chapman avaliou os resultados financeiros de 62 PPST, dos quais 32 avaliaram exclusivamente o resultado sobre os custos médico-hospitalares e observaram uma redução média de 24,5% nesses custos. Segundo o estudo, os fatores associados aos resultados financeiros positivos incluem a adesão de um número elevado de participantes e o fato de ser de longa duração e com escopo voltado para a obtenção dos resultados esperados. Dessa  forma, é possível obter retorno sobre investimento na faixa de 1:6,1 dólares americanos17.

O planejamento de um PPST é um fator crítico para o sucesso do programa. Pronk sugere o método 4-S (size , scope , scalability , sustainability ), ou seja, é preciso que o tamanho do programa seja dimensionado de acordo com a necessidade, que o escopo esteja alinhado com os objetivos da organização, que a implementação seja planejada em escalas progressivas para a obtenção dos resultados e que o programa tenha recursos e apoio adequados para ser mantido por um período de tempo suficiente, de modo a alcançar e identificar os objetivos. Pronk também propõe um modelo de avaliação dos programas denominado PIPE Impact Metrics (penetration, implementation, participation and effectiveness ). Penetração refere-se à proporção da população-alvo que é alcançada com a divulgação do programa ou da intervenção. A implementação reflete o quanto o programa seguiu as especificações do projeto e dos planos de trabalho associados. Participação refere-se à proporção dos indivíduos alcançados que se inscreveram no programa, de acordo com o protocolo estabelecido. E efetividade refere-se à taxa de objetivos bem-sucedidos, ou seja, quantos participantes conseguiram atingir a meta definida no desenho do projeto18.

Neste estudo, não foi possível identificar se o planejamento seguiu a lógica proposta pelo modelo 4S e, por isso, não foi viável avaliar se a implementação seguiu o plano como propõe o modelo PIPE. Estima-se que a penetração foi satisfatória, já que, a princípio, todos os trabalhadores foram informados do lançamento do programa por meio dos veículos de comunicação da empresa. No entanto, frente à baixa adesão inicial (16,9% ou 631 indivíduos) ao programa, é razoável supor que as estratégias utilizadas para o engajamento não tenham sido efetivas. A participação no programa medida pela frequência suficiente de atividade física foi considerada insatisfatória, com apenas 2,1% (80 participantes) ao longo de 1 ano. A avaliação da efetividade do programa no que diz respeito à redução dos custos médico-hospitalares médios per capita/ano foi prejudicada pela baixa participação, impedindo uma conclusão sobre se houve, de fato, impacto financeiro. Dessa forma, não foi possível calcular o retorno sobre investimento (RSI), que é objeto de discussão e pesquisa de muitos estudos internacionais17.

Este estudo apresenta limitações importantes, que precisam ser consideradas para que se replaneje o programa de incentivo à prática regular de atividade física e para que o seguimento de dados futuros possa trazer informações úteis para a organização, os profissionais de saúde que propõem esse tipo de intervenção e os empregadores, que financiam ou subsidiam programas de promoção da saúde no trabalho. A existência e a frequência da prática de atividade física do público-alvo não eram conhecidas no início do estudo e, assim, não é possível afirmar que o programa, de fato, incentivou indivíduos sedentários a iniciar a prática de atividade física ou se os participantes que já tinham um comportamento saudável aderiram ao programa pela conveniência financeira do subsídio oferecido pela empresa. De maneira similar, a prática de atividade física dos que ficaram fora do programa também não foi avaliada pelos gestores da empresa, o que criou um viés de confusão na análise de dados.

A média de idade dos participantes (35,6±7,5 anos) está dentro de uma faixa considerada de baixo risco para as DCNT e de menor utilização dos planos de saúde. Assim, os custos médico-hospitalares médios per capita/ano dessa população podem não ser a melhor maneira de identificar o impacto financeiro de um programa de incentivo à prática regular de atividade física no trabalho. Em estudos futuros, outras variáveis poderiam ser agregadas, como por exemplo a avaliação do impacto do programa sobre o presenteísmo e o absenteísmo. Além disso, outros impactos capazes de proporcionar benefícios indiretos também podem ser avaliados nessa faixa etária, em especial aqueles relacionados aos distúrbios musculoesqueléticos, comuns entre trabalhadores da área da saúde. Estudos mostram que programas que incentivam exercícios físicos no local de trabalho contribuem para a diminuição do número de relatos e da intensidade de dor musculoesquelética percebida pelos participantes19,20.

Considerando que a sensibilidade dos testes estatísticos está, em grande parte, associada ao tamanho da amostra, o número de aderentes ao programa precisa aumentar significativamente para que os impactos do programa possam ser avaliados com maior segurança e para que tenham significância estatística. Estratégias motivadoras de adesão ao programa podem ser repensadas de forma escalonada, com a criação de reforços por meio da divulgação integrada em diferentes veículos de comunicação, com abordagens diversificadas e, de preferência, customizadas e direcionadas aos trabalhadores de maior risco.

A adoção de PPST é defendida por organizações nacionais e internacionais, governamentais e não governamentais, principalmente por conta dos reconhecidos efeitos sobre a saúde e por levar a alterações de comportamentos ou fatores de risco. A literatura científica atual tem apresentado inúmeras evidências desses resultados, incluindo impactos financeiros. No entanto, esses impactos dependem, em grande medida, do desenho e da implantação adequados dos PPST. Em recente revisão sistemática, O’Donnell encontrou impactos financeiros proporcionados por 46 de 47 programas avaliados, com retorno sobre investimento em 41 deles. O grau de retorno financeiro variou de acordo com a metodologia dos estudos pesquisados, do tamanho da amostra, do escopo e da qualidade dos programas, entre outros fatores. A média do RSI entre os dez estudos com melhor qualidade foi de 1:2,28 em dólares americanos21.

Dessa forma, este estudo demonstrou a importância de um melhor planejamento dos PPST, que inclua objetivos claros, indicadores de desempenho do programa, identificação das melhores estratégias para obter e manter uma participação satisfatória e um escopo adequado ao perfil dos trabalhadores e das necessidades da organização. O seguimento ao longo de um período maior, idealmente entre 3 e 5 anos, é necessário para que os resultados pretendidos possam ser obtidos e devidamente avaliados.

 

CONCLUSÃO

A inatividade física contribui para a elevada prevalência de DCNT na população mundial. A adoção de programas de incentivos à pratica de atividade física é uma das iniciativas das empresas dentro das estratégias de promoção da saúde no trabalho e poderá reduzir custos com despesas médico-hospitalares. Neste estudo, não foi possível concluir sobre a efetividade do programa para a redução dos custos do plano de saúde da empresa pesquisada devido aos seguintes aspectos: o desconhecimento do histórico de atividade física da população estudada, que criou um viés de confusão, e a média da idade dos participantes do programa, que não representa a faixa etária da população de maior risco para DCNT. No mesmo sentido, a impossibilidade de rastrear os custos específicos com DCNT criou outro viés no estudo, já que o custo hospitalar médio per capita provavelmente abrangeu gastos não relacionados às DCNT.

Maior tempo de seguimento e ajustes no desenho do programa são necessários para avaliar o seu impacto.

 

REFERÊNCIAS

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Recebido em 19 de Março de 2018.
Aceito em 4 de Maio de 2018.

Fonte de financiamento: nenhuma


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